Por Paulo César da S. C. Fialho.

A ligação entre Atlântico e Pacífico faz parte do imaginário dos movimentos de integração há mais de 50 anos, de modo a emular os modais que cortam os EUA. Esta iniciativa foi impulsionada pela economia, e embora a ligação exista no sul do subcontinente com movimento de cargas e de pessoas desde Valparaíso (Chile) até Paranaguá/PR, sempre existiu a intenção de uma ligação do Norte e do Centro-Oeste brasileiro com os portos de Chile e Peru.

O agronegócio propagou a ideia pela necessidade de reduzir os custos até o Oriente Médio, tornando desnecessária a passagem pelo Canal do Panamá, e Mato Grosso do Sul, situado no coração do continente, importante produtor e exportador de commodities, escoando a sua produção via Oceano Atlântico pelos portos de Santos/SP e Paranaguá/PR, através de rodovias e ferrovias, busca no projeto da “Rota Bioceânica” uma alternativa logística.  

O empreendimento também conhecido como Rota de Integração Latino Americana (RILA), consiste na integração econômica e produtiva entre o Centro-Oeste brasileiro e o Oceânico Pacífico, para materializar a estratégia de crescimento diversificado da economia local, construindo uma agenda de desenvolvimento regional. A internacionalização da RILA se dá especificamente no tocante à circulação de bens, serviços, produtos e pessoas, especialmente através do turismo. Porém, o contexto econômico não é o único atrativo do projeto. Espera-se que sejam desenvolvidas diversas relações entre os países participantes.

A ideia é que as obras sejam finalizadas até 2022. A maior parte dos trabalhos deverá ser realizada pelo Paraguai, que precisará asfaltar mais de 600 km de rodovias. Para viabilizar o Corredor, Itaipu Binacional financiará a construção de uma ponte, no valor de US$ 75 milhões, entre as cidades de Porto Murtinho/MS e Carmelo Peralta, no Paraguai. Mato Grosso do Sul, em específico, tende a catalisar as suas dinâmicas de desenvolvimento com a efetivação do Corredor, pois concentrará uma série de investimentos, servindo de ponto de partida da Rota, que se iniciará em Campo Grande.

A efetivação desse Corredor interligará as cadeias de indústria, comércio, serviços, agronegócio e turismo do Brasil aos portos chilenos de Iquique e Antofagasta, transformando Campo Grande/MS em um importante hub logístico para Brasil, Paraguai, Argentina e Chile, além do mercado asiático. A RILA vai encurtar a distância até a Ásia, principal consumidor de commodities do mundo. A produção chegará até a China de uma maneira mais competitiva, com estimativa de redução de 14 dias de transporte marítimo e redução de custo por container de mais de mil dólares. Ou seja, o Corredor reduz: distância, tempo e custo!

A Rota possui potencial de gerar empregos de qualidade e reduzir a pobreza, criando incentivos para a proteção ambiental. A promoção do turismo ao longo do trecho será um instrumento para uma transição gradual em direção a uma economia mais inclusiva, resiliente, sustentável e importante na dinâmica do Corredor, pois com a possibilidade de viajar aos países vizinhos com custo mais baixo, o turista irá conhecer e se informar sobre a cultura e características das nações limítrofes. Passará, portanto, a ver seu entorno geográfico, eliminando barreiras e indo além da fronteira, responsável por estereótipos equivocados. 

Acredita-se que o território sul-mato-grossense será de sobremaneira impactado com a criação, ao longo da Rota, de uma série de atividades socioeconômicas – dentre as quais o turismo. Da mesma forma que o comércio, o investimento ou a integração produtiva, o turismo tem uma natureza transnacional e como atividade econômica, portanto, desempenhará um papel fundamental para as economias dos países envolvidos na RILA. 

Porém, para o Corredor ser atrativo é necessário melhorar a estrutura e estabelecer políticas que aumentem o conforto e a segurança dos viajantes com especial atenção para as potencialidades turísticas existentes. Ao longo de todo o trecho são observados recursos e atrativos, principalmente nos segmentos do ecoturismo, cultura e gastronomia. Alguns entraves burocráticos dificultam os sistemas de pagamento, de trânsito e de informações para os visitantes, além das questões sanitárias, de segurança e de acessibilidade, que são as principais causas para o aumento do rigor nas fronteiras, devido ao medo do terrorismo e da possibilidade de epidemias. A maior parte das exigências para cidadãos de Brasil, Paraguai, Argentina e Chile circulem na futura Rota são estabelecidas por acordos firmados no âmbito do MERCOSUL. Embora o Chile não seja um país-membro do acordo, ele se enquadra como membro associado, portanto, adota algumas de suas resoluções.

O Corredor possibilitará roteiros que valorizem experiências em ambientes ecologicamente equilibrados, como viajar pelo deserto de Atacama, visitas guiadas a sítios naturais para conhecer a fauna e a flora da região, hospedagem em fazendas na região do Chaco (pantanal paraguaio), visitação em adegas para saborear os vinhos de montanha do norte argentino, e ainda, conhecer as praias do Pacífico e os pratos da culinária chilena. São inúmeras as atrações turísticas, culturais e gastronômicas que podem ser exploradas comercialmente, sem, necessariamente, enfrentar restrição de sazonalidade. Podemos também citar as belezas naturais de Bonito/MS e da Cordilheira dos Andes, essas atreladas às condições climáticas e/ou naturais. 

Quanto à simplificação de processos aduaneiros e centros de controle integrados, podemos citar como exemplo o Passo de Jama (fronteira entre Argentina e Chile), que está no traçado do Corredor. As aduanas possuem integração digital e procedimentos antecipados, com a mínima interferência no tráfego. Tais procedimentos devem ser adotados por todos os integrantes da RILA, no sentido de que mesmo que sistema e procedimentos não sejam unificados, que ao menos se comuniquem. A facilitação desses processos aduaneiros requer investimentos significativos em tecnologia e adequações que implicam na harmonização de práticas, recursos humanos e tecnológicos compatíveis, uniformidade de horários e padrões de comportamento, internet de qualidade e agências dispostas a colaborar.

Em termos gerais, o Corredor pretende aumentar a participação do comércio regional nas exportações e importações de Mato Grosso do Sul, e diversificar a oferta de bens e serviços. A RILA busca a ampliação da oferta e menor dependência estrutural do agronegócio e da China, desenvolvendo um eixo energético e estimulando a criação de polos industriais que agregarão valor aos produtos e serviços, gerando empregos de qualidade. A Rota da Integração oferece um celeiro de oportunidades para várias atividades econômicas, beneficiando substancialmente o desenvolvimento, em diversas regiões dos países envolvidos, com destaque para o turismo.

Dessa forma, o texto espera contribuir para identificar atividades econômicas integradas, oportunidades de investimento e novos fluxos comerciais, que compartilhem ideias, hábitos e cultura, caracterizando um verdadeiro “caldeirão” cultural, social e econômico. A Rota da Integração fomentará as economias, diminuindo as assimetrias regionais, viabilizando potencialidades com o aumento do comércio, turismo, investimentos e integração de projetos aduaneiros. Mais que o tráfego de mercadorias, o Corredor possui diversos objetivos na sua implantação, sendo um fator de integração aos demais territórios, uma vez que há muita riqueza natural, cultural e econômica nas regiões cortadas pelo empreendimento. Atualmente, não existe uma rota que una as belezas do Pantanal, de Bonito, do Chaco paraguaio, dos Andes, do deserto do Atacama e as praias do Pacífico.


Paulo César da S. C. Fialho 

Funcionário Público, especialista em Gestão Pública e Relações Internacionais. 

Advogado e mestrando em Direitos Humanos, Estado e Fronteira.

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